Aprendendo a desacelerar
José Moran
Professor da USP e pesquisador de Metodologias ativas
e de processos de transformação da Educação
Às vezes a vida nos obriga a quebrar nossa rotina, a
contragosto (uma doença inesperada, por exemplo). É uma chance de ouro para refletir, aprender
e mudar.
Aguentamos pressões insuportáveis para conseguir dar conta
de inúmeros desafios em todos os campos: Pressões para sermos bem-sucedidos
profissional, financeira e afetivamente. Pressões para competir, manter-nos
atualizados, sermos os melhores. Se tantos conseguem o sucesso, por que nós,
não?
Estamos educando crianças e jovens para que sejam bem-sucedidos e empreendedores, com uma sobrecarga enorme de tarefas, responsabilidades,
atividades sempre em nome de prepará-los para um futuro imprevisível, para um
mundo do trabalho que será muito diferente. Nossas palavras chave são
“desafios”, “inovação”, “superação”, “criatividade”, “transformação”. Sem
dúvida são importantes; mas compõem um discurso muito articulado, repetido e
hegemônico de superação constante, que pode levá-los a um desequilíbrio e
complicações crescentes. Crianças e jovens devem aprender de uma forma lúdica,
interessante e também brincar mais, de múltiplas formas, sem ficar grudados tanto na tela do
celular.
As redes sociais – principalmente o Instagram – exibem narrativas
de jovens vitoriosos, sorridentes, em festa, felizes. Tudo isso consegue provocar
em muitos uma sensação de defasagem, de uma certa inferioridade, de frustração
pela sensação de ficar para trás e de não fazer o suficiente para vencer.
Está mais do que na hora de rever profundamente esse ritmo
alucinante de responsabilidades que jogamos sobre nossas costas. É ótimo
desacelerar mais, encontrar tempo para refletir, contemplar, descansar.
Vamos cobrar-nos menos, colocar metas menos ambiciosas, aceitar
mais nossas dificuldades. Desacelerar não é desistir, é ir mais devagar; é
cobrar-se menos, é aceitar-se mais. Não precisamos ser os melhores. O
importante é fazer o que está ao nosso alcance em cada etapa, sermos bons o suficiente e ir evoluindo no
nosso ritmo possível (que não precisa ser igual ao dos demais).
Falamos muito hoje em competências socioemocionais, em
desenvolvimento pessoal, em projeto de vida. Tudo faz pleno sentido, se nos
tornamos mais coerentes, humanos, livres e realizados no nosso ritmo e da forma
que nos for possível em cada momento. Livres para fazer escolhas mais humanas,
afetivas e que nos tragam mais paz no dia a dia.
Por onde começar? Por desacelerar, diminuir a quantidade de
compromissos, de atividades e – principalmente - de cobranças. Parar mais, meditar
de vez em quando, olhar menos vezes o celular. Um pouco mais de tempo de
reflexão, de parada, de quebra do ritmo frenético nos fará muito bem e nos
ajudará a enxergar melhor, a ampliar nossa percepção, nossos horizontes e a
manter um contato mais rico e profundo conosco, com as pessoas ao nosso lado,
com a natureza e com a vida. Vale a pena desacelerar um pouco para aprender a
viver mais e melhor.
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