A aprendizagem que vale a pena

A educação é um processo gradual de aprender a discernir o que pode ajudar-nos a construir uma vida que valha a pena, entre tantas opções possíveis, que nos instrumentalize para ser mais livres, mais autônomos, mais realizados.

A educação nos ajuda a aprender a selecionar, avaliar e contextualizar o que é mais significativo, importante entre tantas informações que nos inundam sem parar, entre tantos sentimentos que despertam, entre tantos valores contraditórios. Aprender a desaprender, a deixar de lado o que já não nos serve mais, o passado que nos oprime, tolhe,a gerenciar melhor nossas escolhas pessoais, afetivas, profissionais cada vez mais coerentes, autênticas, desafiadoras e realizadoras.

A educação é um processo complexo, tenso, contraditório e permanente de tornar nossa vida mais rica, impactante e equilibrada entre conhecer, sentir, comunicar-nos e agir, ampliando nossa percepção de múltiplas camadas da realidade, nossa capacidade de acolher e amar, de enfrentar situações mais complexas, mais desafios e projetos.

O maior desafio que temos é aprender a transformar-nos em pessoas cada vez mais humanas, sensíveis, afetivas e realizadas, andando na contramão de muitas visões materialistas, egoístas, deslumbradas com as aparências. De pouco adianta saber muito, se não praticamos o que conhecemos.

A educação tem também uma dimensão claramente social, de aprender com a experiência dos outros, de inter-aprendizagens, de saber conviver melhor com as múltiplas diferenças de idades, ideologias, culturas, valores. Mas na educação é importante também a dimensão pessoal, de apoio ao desabrochamento das potencialidades de cada um, de oferecer condições para que cada pessoa tenha meios para progredir, para realizar-se, para viver uma vida digna a partir de alguns valores sociais.

A educação é válida quando consegue que mais pessoas se sintam motivadas intimamente a desejar ampliar seu conhecimento, sua sensibilidade, seus canais de comunicação, suas atitudes, práticas e valores em cada etapa das suas vidas.

Aprendemos pouco, quando só focamos uma das dimensões, como a profissional, quando só pensamos em ganhar dinheiro, ter muitos bens, ter mais poder. Aprendemos pouco quando nos acomodamos na rotina, na previsibilidade, em esquemas prontos e não acreditamos que possamos evoluir mais. Aprendemos pouco quando nos mostramos de um jeito diferente ao que percebemos, sentimos e acreditamos. Aprendemos pouco quando desistimos de perseverar no processo de crescer mais, de compreender melhor, de aceitar-nos plenamente, de tentar as mudanças possíveis em cada momento. Aprendemos pouco quando nos preocupamos excessivamente pelo que os demais pensam, pelo julgamento social, pelas aparências, por manter uma imagem que nos faz representar papéis, que nos desfigura em relação ao que somos e a como nos vemos.

A educação é eficaz quando nos ajuda a enfrentar as crises, as etapas de incerteza, de decepção, de fracasso em qualquer área e nos ajuda a encontrar forças para avançar e achar novos caminhos de realização.

A educação é eficaz a longo prazo, quando ao olhar para trás, conseguimos perceber que avançamos, que evoluímos passo a passo, no meio de contradições, desvios e incertezas e que nos mantivemos coerentes com nossos valores fundamentais pessoais, familiares, profissionais e sociais.

A educação é mais eficaz quando conseguimos fazer a ponte entre nossas expectativas e contradições, construindo uma identidade coerente, que integre o pessoal, o profissional e o social.



Fases diferentes de aprendizagem

Quanto mais avançamos em idade, mostramos de forma mais clara o que aprendemos de verdade, quem somos, o que é sólido e o que é superficial, o que permanece no meio das muitas etapas pelas que passamos, o que é autêntico e o que representação. Revelamos cada vez mais se somos pessoas evoluídas, medíocres ou complicadas.

Na infância, agimos principalmente em função de referências externas, das pessoas que mais convivem conosco – pais, familiares, docentes, amigos. Na juventude enfrentamos o deslumbramento das muitas descobertas em todos os campos, testamos nossos limites, buscamos definir nossa identidade, abrimos um leque amplo de vivências sensoriais, emocionais, intelectuais, existenciais, profissionais. Ainda é muito difícil comprovar o que é real, válido, testado, coerente, definitivo.

Na primeira fase da idade adulta realizamos escolhas mais personalizadas, permanentes, que nos definem em todos os campos – o intelectual, o emocional, o profissional. Já mostramos mais claramente nossa identidade, nossa personalidade, nossas idéias, emoções e valores. Mas ainda há uma margem de incerteza, de imprevisibilidade na permanência e acerto das escolhas. Muitas decisões podem ser justificadas por necessidades prementes como as econômicas, familiares, conjunturais, como não posso mudar de trabalho porque tenho muitas contas a pagar, ou não posso me separar porque os filhos são pequenos.

Na segunda fase da maturidade, aí sim percebemos o que aprendemos, o que construímos, o que nos identifica, o que é permanente e o que é transitório, o que tem valor e o que é superficial; a imagem que comunicamos e a que os demais percebem. É uma etapa de consolidação, mas também pode ser de mudança, de revisão de valores e atitudes. Podemos romper com modelos, situações que nos oprimem e buscar novos desafios, sermos pessoas mais livres e realizadas, mesmo num contexto de um progressivo declínio físico.

Enquanto uns avançam ao longo do tempo na qualidade da sua aprendizagem, dos desafios, outros parece que estacionam, que fazem só manutenção ou até regridem. “Vão vivendo”, contentando-se com as expectativas mínimas, com receitas repetidas, com o arroz e feijão básicos, sem buscar degustar tantos outros manjares possíveis.

Cada etapa da vida tem seu fascínio, seus motivos para gostar de aprender mais. Esse é um dos encantamentos da vida: poder evoluir, crescer, ser pessoas mais plenas, mesmo com muitas contradições, dificuldades e perplexidades. Vale a pena sempre manter a atitude positiva, ativa, curiosa, atenta de querer aprender sempre mais, de fazer a ponte entre o exterior e o interior, entre o social e o pessoal, entre o intelectual, o emocional e o comportamental.

Podemos transformar a nossa vida em permanente, paciente, afetuoso e emocionante processo de aprendizagem. Em todos os momentos, em todos os espaços, em todas as situações podemos aprender muito ou pouco, dependendo da atitude profunda com que as enfrentamos, da motiivação profunda que nos norteia.
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Do meu livro A educação que desejamos: novos desafios e como chegar lá, Papirus, cap. 3, p. 73-74, texto revisto e ampliado.

Comentários

Anônimo disse…
Boa recomendação, obrigado.
http://cursoonline24hora.blogspot.com/
Unknown disse…
Prezado Professor José Moran!
Saudações Reflexivas!
O que tenho percebido nos ciclos da vida que foram homens simples fizeram a grande diferença e marcaram a história da humanidade.
Estes homens foram professores?
Não! Foram mestres!
Agora me pergunte se eles foram educadores?
Por excelência!
O que tem faltado no corpo docente é este ponto de vista vocacional, que não estamos na escola somente para ensinar conceitos de filosofia, matemática, geografia, história.
Nosso dever é o de vislumbrar o olhar das crianças, jovens, adolescente e adultos com filosofias de vida, vivências filosóficas que nos levem a sermos mais autônomos, independentes de decisões alheias, seres reflexivos que saibam tomar suas próprias decisões diante os mais diversos problemas (situações) que a vida nos propõe.
Talvez tenha faltado mestres por não encontrarmos mais discípulos!
Talvez eu esteja enganado.
Sou admirador de provérbios populares, eles demonstram a sabedoria do mundo no anonimato.
Um destes provérbios reza que 'quem obedece nunca erra'. Francisco de Assis foi um grande reformador da ordem Beneditina e da própria igreja católica, lembro de um de seus pensamentos que dizia "prefiro errar com a Igreja do que acertar sozinho". Isto significa que precisamos acreditar mais no potencial das comunidades, precisamos uns dos outros. Os que sabem mais compartilham o que sabem e constroem conhecimento com os que ainda não sabem tanto. Temos de procurar conhecer mais as diretrizes que determinam nossa profissão de educadores. Que o maior objetivo do professor é a aprendizagem e não a ensinagem.
Se aprendermos que a escola é local de aprender, haverá uma transmutação na educação, porque a escola é um local de ensinar, porém não é o único local de aprender. Por estas razões fiquei feliz em ler o seu artigo, por acreditar que a educação é possível partindo de pessoas resolvidas, maduras que se conhecem e que vão em busca da autorealização (FELICIDADE). Só permite a felicidade quem realmente é feliz.
Problemas todos temos, o que diferencia umas pessoas das outras é a consciência que se tem de seus potenciais e limitações!
Fique com o abraço de um Catarinense que ama a Educação!
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Cordialmente:
Prof. Geverson Luz Godoy
Ola Professor José Moran,

Leio sempre seus artigos sobre Educação destacando os referentes ao uso das tecnologias.Gosto do estilo simples e a clareza de suas abordagens.Escrever sobre temas tão diversos com tal clareza por si só já é uma Arte. Compartilhar idéias sobre como podemos tornarmos melhores seres humanos por meio da Educação em qualquer época da vida é certamente disponibilidade de uma pequena parcela de mestres sábios. Obrigada e parabéns!

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