Por que avançamos tão devagar na Educação?
José Moran
Educador e pesquisador de projetos de
inovação
Há uma pressão enorme por
mudanças na educação em todos os níveis. Estamos de acordo em que precisamos
ensinar e aprender de forma mais criativa, personalizada, por experimentação e
design. Encontramos algumas escolas e universidade diferenciadas, com propostas
pedagógicas muito interessantes. Mas a maioria vai mais devagar do que
desejaria.
Por que temos tantas dificuldades
em transformar a educação?
Há condições estruturais que
dificultam a mudança e que são essenciais para uma transformação mais
consistente, sistemática na educação do pais: não conseguimos atrair com os
baixos salários e valorização profissional os melhores gestores e docentes
possíveis. Nossas políticas públicas não têm continuidade e consistência,
excesso de burocracia, visão mercantilista em diversos grupos privados, cultura
tradicional de boa parte da sociedade, incluindo os alunos. São inúmeros os
fatores que explicam a lentidão.
Apesar disso, observo que há
escolas e universidades interessantes que desenvolvem propostas atraentes, interdisciplinares,
atraem e mantem bons profissionais, desenvolvem projetos relevantes, encantam
os estudantes, envolvem as famílias. Gestores e docentes conversam de verdade,
aprendem juntos, ouvem os alunos, reavaliam com frequência os resultados.
Por que alguns conseguem avançar
mais claramente, enquanto outros – em condições semelhantes - o fazem mais
devagar?
Em muitas instituições, o
discurso é mais avançado que a prática. Falam em inovação e transformação, mas algumas
contradições dificultam conseguir avanços mais rápidos e profundos. De um lado,
o projeto pedagógico está bem atualizado, mas na sua execução parte dos
docentes desenvolve práticas avançadas enquanto outra permanecem nas convencionais.
Não há sintonia, interação, compartilhamento real das práticas, mesmo que,
aparentemente, todos sigam as mesmas diretrizes.
A escola - básica e superior - é
feita por pessoas e sua transformação, também. Muitos gestores, docentes,
estudantes e famílias sentem-se inseguros no processo, resistem, intimamente,
hesitam ou postergam a aprendizagem de novas metodologias, tecnologias,
processos. Uma parte boicota silenciosamente o projeto e torna mais lenta a sua
adoção na prática. Onde há avanços menores, existe algum grau de dificuldade de
entendimento real, de acertar as diferenças, falta de comunicação verdadeira.
A dificuldade em mudar deve-se
principalmente à resistência intima das pessoas, à diferença entre o que dizem
e fazem, entre o discurso e sua prática. O grande problema das organizações é a
dificuldade em dialogar no sentido profundo, em alinhar seus processos,
valores, ritmos. Algumas organizações acertam de verdade as diferenças, em
outras as aparências enganam, há uma luta encoberta; umas conversam de verdade,
enquanto outras vivem tensões mal resolvidas, com grupos que se fecham entre si
e boicotam os que querem mudar.
A dificuldade mais estrutural de
mudar está atrelada ao nosso egoísmo, visão de mundo deficiente, estreiteza
mental e emocional, à desigualdade profunda que construímos nos últimos anos –
apesar dos avanços - à dificuldade em
buscar soluções conjuntas, de entender o diferente. Vivemos – a maioria - em
casulos, em condomínios pequenos físicos e mentais, apegados a valores muito
rasteiros que nos mantêm presos a valores muito simplórios, que dificultam nosso
caminhar para tornar-nos mais livres, solidários, menos desiguais.
Os avanços na educação também são dificultados pelo incremento de alguns grupos econômicos, principalmente grandes, com foco no mercado. São empresas empreendedoras, que veem a educação como investimento econômico, e estão mais atentas ao retorno financeiro do que a melhorar a qualidade da aprendizagem dos alunos. Trabalham com escala, turmas grandes, pouca valorização docente e uso intensivo de tecnologias para baixar custos.
Mesmo grupos avançados em ideias
têm dificuldade em trabalhar em parceria; cada um cuida da sua empresa, sua
Startup, sua ONG, da
promoção da sua solução, do seu negócio. Os modelos de corrupção, de oferecer
vantagens também acontecem na educação. A nossa legislação complexa,
burocrática de avaliação predominantemente quantitativa, complica ainda mais os
que têm medo de ousar: preferem agradar o MEC, preencher os indicadores
previstos, conseguir bons resultados oficiais.
Em síntese, encontramos
organizações com todas as condições para inovar, que o fazem de forma parcial e
contraditória e, ao lado, outras, com muitos menos recursos, que conseguem
desenvolver projetos mais arrojados e coerentes com o que se espera de um mundo
conectado. É
importante conhecer os modelos das escolas muito inovadoras, porque sinalizam
uma tendência irreversível para as demais, no médio prazo.
Há uma
pressão enorme por mudanças na educação em todos os níveis. Essa pressão é
benéfica para todos e acelerará o ritmo das transformações. Num mundo
multicultural, permanentemente conectado e em profunda transformação, faz todo
sentido a educação baseada em valores, desenvolvimento de competências e
aprendizagem por projetos. As
aprendizagens por experimentação, por design,
a aprendizagem maker são
expressões atuais da aprendizagem ativa, personalizada, compartilhada.
As escolas (básicas e superiores)
precisam trabalhar em dois planos, o de curto e o de médio prazo. Há mudanças que
são mais facilmente implementáveis em um ou dois anos, enquanto que há outras que
precisam ser cuidadosamente preparadas para serem bem-sucedidas, evitando
possíveis retrocessos e reviravoltas.
O primeiro passo e o mais
importante é o da mudança mental, da mudança cultural, da discussão ampla, do
envolvimento de todos, mostrando que estas novas formas de aprender fazem mais
sentido. As metodologias com tecnologias
podem começar dentro de uma disciplina e ir agregando progressivamente áreas de
conhecimento.
Com o domínio das metodologias ativas, o avanço dos projetos
integradores, o passo seguinte é dar maior atenção às competências
socioemocionais e ao projeto de vida do aluno. Isso possibilitará planejar
posteriormente um currículo por competências, áreas de conhecimento, mais
personalizado e modelos híbridos mais aprofundados.
É preciso viver a vida que se
pretende mudar. Quanto mais avançarmos em conhecimento, valores, competências e
práticas de vida libertadores, mais ajudaremos a transformar nossas vidas e as
dos nossos estudantes. Pessoas que vivem o que aprendem são pessoas que
transformam.
Comentários
Trabalho em uma escola pública e o que escreveu é a nossa realidade," o discurso é mais avançado do que a prática", a cada ano vejo que as propostas não conseguem ter êxito, fica só no papel. Eu estou lotada na sala de multimeios, tendo aprender a fazer uso dos recursos disponíveis para contribuir na aprendizagem dos alunos, mas tenho que aprender e ser resistente ao negativismo dos demais.