Aprendendo a desenvolver e orientar projetos de vida
Nossa vida pode ser percebida
como um projeto que se redefine continuamente com novos conhecimentos,
experiências, vivências. Esse processo pode tornar-se muito mais enriquecedor,
quando estamos atentos e o desenvolvemos intencionalmente em nós mesmos e nos
demais.
As instituições mais inovadoras
desenham uma política clara de orientação dos alunos para que se autoconheçam e
desenvolvam seus potenciais. Os projetos de vida são um componente curricular
transversal e visam promover a convergência, de um lado, entre os interesses e
paixões de cada aluno e, de outro, seus talentos, história e seu contexto. Os
projetos estimulam a busca de uma vida com significado e útil pessoal e
socialmente, e, como consequência, ampliar a motivação profunda para aprender e
evoluir em todas as dimensões.
Projetos de vida são orientações
para que cada aluno se conheça melhor, descubra seus potenciais e os caminhos
mais promissores para a sua realização em todas as dimensões. Falamos de
projetos de vida, porque eles se refazem, redefinem, modificam com o tempo. Não
são roteiros fechados, mas abertos, adaptados às necessidades de cada um. São projetos
porque estão em construção e tem dinâmicas que ajudam a rever o passado, a
situar-se no presente e a projetar algumas dimensões do futuro.
Os projetos de vida olham para o
passado de cada aluno (história), para o seu contexto atual e para as suas
expectativas futuras. Isso pode ser trabalhado com a metodologia de design, focando
a empatia, a criação de ambientes afetivos e de confiança, em que cada aluno
pode expressar-se e contar seu percurso, suas dificuldades, seus medos, suas
expectativas e ser orientado para encontrar uma vida com significado e desenhar
seu projeto de futuro.
Todos os professores e todas as
atividades de ensino-aprendizagem podem contribuir para que cada aluno se
conheça melhor, se oriente de forma mais consciente. Alguns o fazem de forma
mais institucional, direta e assumem o papel de mentores, acompanhando mais de
perto os alunos no seu dia a dia, ajudando-os a descobrir seus interesses, talentos
e fragilidades e a ir tomando decisões para modificar sua visão de mundo e
desenhar caminhos para seu futuro. É importante ter uma equipe de mentores com
perfis complementares para que consigam acompanhar as diversas etapas de cada
projeto (diagnóstico, design, implementação, avaliação) e as diferentes visões
de mundo dos alunos.
No começo deve ficar bem claro para o aluno
todo o processo, os momentos mais fortes, os materiais de apoio, os mentores
específicos atribuídos. Isso garantirá que não seja só uma ideia no papel, mas
uma ação viva continuada.[1]
Um caminho interessante para o
projeto de vista é o da construção de narrativas, em que cada aluno conte sua história
utilizando as diversas tecnologias disponíveis. Construímos nossas histórias
pessoais, nossos projetos de vida num rico fluir de passagens e linguagens
entre os diversos espaços físicos e digitais, que se entrecruzam, superpõem e
integram incessantemente. Nossa vida
é uma narrativa dinâmica com enredo fluido, costurado com fragmentos das múltiplas
histórias que vivenciamos e compartilhamos de diversas formas com alguns mais
próximos, física e digitalmente. Nesta narrativa em construção, nossa vida
adquire mais sentido, quando conseguimos perceber alguma coerência, alguns
padrões importantes, junto com algumas descobertas iluminadoras. Construímos a
vida como uma narrativa, com enredos múltiplos, com diversos atores internos e
externos, que se explicita nessa troca incessante de mensagens, vivências e
saberes. Aprendemos mais e melhor quando encontramos significado para o que
percebemos, somos e desejamos, quando há alguma lógica nesse caminhar - no meio
de inúmeras contradições e incertezas - que ilumina nosso passado e presente e
orienta nosso futuro.
A educação no sentido mais amplo
é aprender - e ajudar a que outros aprendam pela comunicação e compartilhamento - a construir
histórias de vida, que façam sentido, que nos ajudem a compreender melhor o
mundo, aos demais e a nós mesmos; que nos estimulem a evoluir como pessoas, a
fazer escolhas, nos libertem das nossas dependências e nos tornem mais
produtivos e realizados em todos os campos, como pessoas e cidadãos. “Se as
pessoas são aceitas e consideradas, tendem a desenvolver uma atitude de mais
consideração em relação a si mesmas” (ROGERS, 1987, p.65).
Ivor GOODSON pesquisa há anos as
histórias de vida como processos de aprendizagem: “Ver a aprendizagem como algo
ligado à história de vida é entender que ela está situada em um contexto, e que
também tem história – tanto em termos de histórias de vida dos indivíduos e
histórias e trajetórias das instituições que oferecem oportunidades formais de
aprendizagem, como de histórias de comunidades e situações em eu a aprendizagem
informal se desenvolve” (GOODSON, 2007, p 250).
O currículo e a aprendizagem são narrativas que também se constroem no
percurso, em contraposição às narrativas prontas, definidas previamente nos
sistemas convencionais de ensino.
A pessoa motivada para aprender
consegue evoluir mais e desenvolver um projeto de vida mais significativo. Por isso, além de saber contar histórias e
estimular os alunos a que contem suas histórias, é importante que os ajudemos a
perceber que a vida é uma grande história que vale a pena ser vivida e que a
vamos construindo em capítulos sucessivos: crianças, jovens, adultos e
idosos. Isso amplia enormemente o
potencial motivador para viver, e facilita a percepção de que, no meio de
múltiplas pequenas histórias, estamos construindo uma narrativa silenciosa que
as integra em uma sequência significativa. Costumamos dar muita mais ênfase a
conteúdos específicos do que à construção desta narrativa integradora de vida.
O projeto de vida é a grande história que precisa ser estimulada em cada aluno
pelos adultos.
Professores e pais, nas escolas
inovadoras, transmitem mensagens fundamentais para as crianças: “Persigam seus
sonhos” e os ajudam a realizá-los (orientação, apoio), mesmo que depois mudem. O maior desafio que temos é aprender a
transformar-nos em pessoas cada vez mais humanas, sensíveis, afetivas e
realizadas, vivendo de forma simples, andando na contramão de muitas visões
materialistas, egoístas e deslumbradas com as aparências. De pouco adianta
saber muito, se não saímos do nosso egoísmo nem praticamos o que conhecemos.
Infelizmente muitos só navegam na
superfície dos acontecimentos, sem construir um sentido mais profundo para sua
existência; desenvolvem intuitivamente seus projetos, muitas vezes de forma
descontínua, fragmentada, não sistemática. Permanecem, às vezes, no nível da
subsistência, de garantir a sobrevivência, de percepção no senso comum e de
busca de satisfações sensoriais. Com uma
orientação competente podem ampliar sua visão de mundo, diminuir seus
principais medos e obstáculos e construir um futuro mais livre e realizador.
Algumas referências:
Milena MASCARENHAS.
Aula de projeto de vida prepara jovem para desafios.
GOODSON, Ivor.
Currículo, narrativa e o futuro social. Revista Brasileira de Educação
v. 12 n. 35 maio/ago. 2007
MORAN, Jose Manuel. A
educação que desejamos: novos desafios e como chegar lá. 5ª ed. Campinas,
Papirus, 2015.
ROGERS, Carl. Tornar-se pessoa. Lisboa, Morais, 1987.
Comentários