Aprendendo a envelhecer

A velhice é a nossa etapa da vida mais desafiadora. Apesar de conseguimos hoje viver muito mais anos que nossos avôs, aos poucos percebemos o progressivo avanço do declínio físico, às vezes também do mental e é inevitável o questionamento sobre como encarar esta longa fase de maturidade, de ricas vivências entrelaçadas com a frequente percepção da lenta aproximação do fim. Como encontrar motivação para viver, quando tudo parece que conspira contra a vida? Vale a pena continuar aprendendo e evoluindo? Faz sentido fazer planos para um amanhã tão incerto? Não seria melhor resignar-se, perder a esperança e entregar os pontos?.

Quando mais jovens, sabemos da fragilidade da vida, conhecemos algumas perdas, mas predomina a sensação de que ainda falta muito tempo e que é um asunto que pode ser deixado para o futuro. Quando mais maduros, mesmo na expectativa de vida mais longa, a questão se coloca de forma cada vez mais perceptível. Driblamos a morte parcialmente, a esquecemos momentaneamente, nos iludimos na esperança de que esse momento se retarde ao máximo, mas temos consciência de que é uma luta cada vez mais perdida.

Uma das questões mais difíceis de abordar na nossa sociedade é a aprendizagem de viver com dignidade e realização essa última longa e assustadora etapa da vida. Tudo é feito para destacar a juventude e esquecer a velhice e a morte. As pessoas sabem que isso acontecerá, mas, muitas preferem fugir, virar as costas, refugiar-se na curtição do momento, no imaginário ou na reelaboração das lembranças do passado. A fé religiosa também nos oferece um grande apoio, porque promete a continuidade em outra vida. Mas, no íntimo, sentimos muitas dúvidas em relação a esse depois.


Pessoalmente encontrei sentido para continuar motivado, nesta fase complexa da vida, no exemplo e palavras do psicólogo humanista Carl Rogers. Famoso e respeitado no mundo inteiro, ele afirmou que, com mais de 80 anos, apesar do seu declínio físico, encontrava uma grande motivação e alegria em continuar aprendendo, revendo suas idéias, suas certezas e podendo ser útil para muitas pessoas. Isso me abriu horizontes de que era possível encontrar sentido e motivação para encarar a maturidade e a velhice com mais confiança e esperança.

Ter ideais motrizes, projetados para o futuro – vivendo plenamente no presente – nos ajuda a direcionar nossa vida. Servem como centro unificador de uma sequência de atividades aparentemente sem conexão, como foco que organiza leituras, reflexões, práticas, expectativas. As pessoas, que estabelecem um diálogo rico entre seus ideais e sua concretização possível no cotidiano, tendem a fazer avanços mais consistentes, a enfrentar as dificuldades que aparecem, não desanimando nos períodos mais obscuros e, no conjunto, se realizam mais.

O ideal nos impulsiona a seguir, até onde nos for possível, também na fase final da vida. Mantém viva a esperança, orienta nossas pequenas ações, costura os diversos momentos e atividades. Quem não tem um ideal motivador procura o que fazer, em que se ocupar, como se entreter, mas sem direcionamento parece que está preenchendo espaços, ocupando o tempo, buscando o que fazer. O outro faz as mesmas coisas, com sentido e foco.

É importante aprender a envelhecer com dignidade, coragem e paz, continuando a evoluir como pessoas, como profissionais, como pais, companheiros, cidadãos, cada dia, enquanto tivermos forças, até o fim.


Enquanto uns encontram motivação para avançar em projetos de crescimento e realização, também nesta fase, outros desistem, desanimam ou refugam, com medo. Procuram fora de si motivos para continuar vivendo: em momentos de entretenimento, de ocupação, de sobrevida. Aprendem pouco com o cotidiano: são como náufragos, a deriva, que só pensam em continuar vivos. “Vão levando”, contentando-se com suas expectativas mínimas, com suas receitas repetidas, com o arroz e feijão básicos, sem degustar tantos outros manjares possíveis.

Cada um tem suas circunstâncias, suas razões, para as atitudes e opções que faz ou deixa de fazer. Mas é triste constatar como muitos se encolhem, apequenam ou amedrontam.

O desafio mais interessante da nossa vida é transformá-la – no meio de contradições e através de um processo paciente, afetivo e perseverante de aprendizagem – em evolução crescente e realização mais plena.
 
Convém traçar estratégias para viver melhor esta etapa da velhice, combinando planos viáveis com um certo “deixar acontecer”. Planejar ações profissionais, de entretenimento ao nosso alcance. Não deixar-se dominar pelo medo, desânimo, abatimento. Teremos perdas em alguns campos como no da saúde, mas se conseguimos manter uma visão positiva e proativa da vida, será mais fácil enfrentar as dificuldades pontuais que encontrarmos. Junto com o planejamento também vale a pena deixar acontecer, estando abertos para cada acontecimento que se apresentar. Manter a mente ativa, com atividades interessantes é o melhor caminho para sentir-nos úteis e realizados.



Uma das questões mais difíceis é aceitar as perdas de pessoas queridas, que são nossas referências afetivas. É bom manter a lembrança dos que amamos e se foram e, ao mesmo tempo, curtir as pessoas amigas que ficam, de forma mais intensa, enquanto pudermos. Não sabemos o que nos espera, mas podemos viver cada dia intensamente, como uma oportunidade que se renova de valorizar o que conseguimos e de avançarmos no caminho de múltiplas realizações em tantos campos que a vida nos oferece.


Cada etapa da vida é única, diferente e fascinante, que nos permite avançar – no meio de contradições - na ampliação da nossa percepção, conhecimento, valores, emoções e atitudes. Esse é um dos maiores encantamentos que a vida nos oferece: o de poder evoluir, crescer e tornar-nos pessoas mais interessantes, equilibradas e realizadas, apesar das freqüentes dificuldades e incertezas que experimentamos. Vale a pena manter sempre nossa atitude atenta para aprender mais, para ampliar a comunicação entre o mundo exterior e o nosso mundo interior, para avançar na integração cada vez maior entre as dimensões intelectuais, emocionais e éticas das nossas vidas.


Em todos os momentos, nos diferentes espaços em que nos movemos, em todas as situações que vivenciamos podemos aprender muito ou pouco, evoluir mais ou menos como pessoas, dependendo da atitude profunda que orienta nossa vida. Se estivermos mais atentos para aprender com tudo o que nos rodeia, refletindo mais sobre o que nos acontece, estando sempre abertos a relacionar-nos melhor com os que estão ao nosso lado, constataremos significativos avanços em todas as dimensões: pessoal, profissional, familiar, social.

Comentários

Marli Fiorentin disse…
Caro professor !

Eu penso que até o nosso momento final, precisamos continuar projetando nossa vida. Mas eu concordo que é uma etapa difícil, que dá medo e talvez traga muita solidão, se não tivermos alguém que nos olhe. Se tivermos sorte de poder ter um corpo que consiga realizar o que a mente quer, pelo menos em parte, tudo bem. Mas o pior é se justo a mente nos trair, a memória falhar e perder de vista a própria história. Hoje seria o aniversário de minha mãe, mas faz 5 meses que ela se foi, quase junto de meu pai. E seus últimos 10 anos foram assim.Ainda bem que pudemos estar junto, minimizando o sofrimento, que sei, mesmo assim ocorreu, pois mesmo com vários filhos, cada um está envolvido com sua própria batalha de vida. Sempre me questiono sobre o futuro e é inevitável uma certa angústia, mas acho que para cada tempo, Deus nos dá a força necessária para superar as dificuldades. Muita saúde para o senhor e vida longa! Abraço!
José Moran disse…
Cara Marli:
Gostei das suas colocações, sensibilidade e de como encara sua relação com seus pais recentemente falecidos. Todos temos nossas pessoas queridas que se vão e que nos deixam lembranças, carinho e um certo vazio. Continuam na nossa memória e nos servem como estímulo para avançar todos os dias no nosso próprio caminho de uma realização maior. Continue assim. Grande abraço. Moran
Ângela Almeida disse…
Olá Moran!

Bom dia! Vou fazer um projeto de pesquisa pra tentar vaga no mestrado em educação. Sou programadora e professora.

No mestrado tem uma linha de pesquisa em cultura digital e em inovações pedagógicas. Mas por ser muito ammplo, não consegui ainda decidir um tema.

Poderia me ajudar, dando alguma dica ?

Obrigada!
Olá prof. Moran

Sempre gosto muito de suas reflexões e aprendo muito com seus artigos. ANo passado fui regente de informática na educação e trabalhamos muitas de suas ideias.
Gostaria de te convidar para conhecer o meu Educando o Amanhã - http://educandooamanha.blogspot.com.br/. Vamos trocar banners e ideias?

Um abraço,

Semíramis
Unknown disse…
Inspirador ^^
Agradecido e agraciado pelas palavras!
Unknown disse…
Olá. Estive visitando o seu blog, gostei muito e me tornei seguidora.
Eu também tenho um blog, o “Super Promonauta”. Se puder me faça uma visitinha também, e se por acaso gostar e quiser me seguir, será uma honra.
Obrigado e parabéns pelo site!

http://super-promonauta.blogspot.com.br
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verno arabas disse…
Professor!
O desafio mais fascinante da vida
é o de VIVE-LA É O PRESENTE. Como o senhor mesmo disse:... é transformá-la
no meio de contradições e através de um processo paciente, afetivo e perseverante de aprendizagem- em evolução crescente e realização mais plena. Temos exemplos magníficos: Edgard Morin (91 anos) em pleno exercício para uma educação interdisciplinar e valores crescentes nesta área. Nosso grande arquiteto que morreu aos 101 anos, trabalhando,planejando, supervisionando seus projetos.Nossa mente não envelhece, a qualquer tempo, temos o direito e dever de correr atrás dos nossos sonhos. Perdas ocorrerão, isto não temos como fugir, é a única certeza que temos!
Mas se alienar, se limitar aí sim é morrer em vida. O conhecimento ninguém nos tira é nosso, é poder adquirido. Temos portanto que aproveitar nosso momento aqui. Aprendendo sempre.
Forte abraço!

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