O abismo que nos separa das crianças e como diminuí-lo

Cada geração avança até um determinado ponto no domínio das tecnologias. Geralmente há um descompasso na sua apropriação e na relação que a geração anterior mantém com a atual. A geração da TV conseguiu dominar algumas das funcionalidades do videocassete e da incipiente Internet, mas sente dificuldade em trabalhar com os inúmeros aplicativos das últimas tecnologias móveis. Já as crianças e os adolescentes parece que nasceram com um smartphone na mão, tamanha é sua facilidade em explorá-lo.

Os mais adultos - em geral - nos limitamos a um uso mais básico. E cada pessoa estabelece inconscientemente um limite para a aceitação  do novo. Conheço pessoas que mal utilizam o celular, ou só acessam o email ocasionalmente. O que está claro é que se abre um abismo entre as gerações mais antigas e as mais novas na sua relação com as tecnologias no cotidiano. Para nós mais velhos torna-se muito difícil acompanhar todos os aplicativos, as novidades e principalmente compreendê-las em profundidade e utilizá-las em todo o seu potencial.
Quando vejo um menino de dois anos descobrindo jogos escondidos no Iphone e trocando de aplicativos, de acordo com a conveniência, percebo o abismo que me separa dele, a agilidade e intuição que me faltam. Com o passar do tempo a sensação que temos é  de perder o passo, de distanciamento do mundo dos jovens, da sua linguagem,interesses, valores, percursos. Jogam alucinadamente com inimigos que se multiplicam na tela em fases intermináveis, Exibem habilidades perceptivas e motoras notáveis, muito superiores aos nossos passos trôpegos digitais. Mergulham horas em jogos, vídeos e conversas online. O lema parece ser: Tudo, agora, já. Todas as telas, todos os aplicativos, todas as linguagens, todas as festas, “youtubes” e “twitadas”.
Como ensinar a estas crianças que nasceram dentro desse mundo digital?
Eu valorizo o texto; eles valorizam a ação, o ritmo frenético de múltiplas imagens e flashes. Eu tenho uma caneta a mão e escrevo idéias; eles filmam tudo e o postam no Facebook. Eu organizo o pensamento em frases e parágrafos; eles postam sensações, vídeos, compartilham tudo, não temem vírus nem perigos.
Sabemos que precisamos mudar a forma de ensinar e de aprender, mas só conseguimos avançar até um certo ponto, até o ponto do encontro afetivo e de uma parte da linguagem que compartilhamos em comum. Há uma margem de incerteza e incomunicação com os pequenos. É muito difícil que nós, mais analógicos, consigamos uma comunicação profunda com as crianças digitais.
Num olhar mais aprofundado, percebo que ambos nos necessitamos. Minha experiência pode ajudá-los a enxergar além das aparências, a problematizar o que parece definitivo, a encontrar algum ordem no caos, a fazer sínteses diferentes. Por trás da agitação alucinada, há olhinhos interrogadores, inquietos, que buscam inúmeras respostas. Muitas – as principais – não as temos, mas podemos ajudá-los a pensar, a analisar, a perceber melhor, a desacelerar seu ritmo com toques de reflexão e paz.
O entusiasmo e generosidade deles são fantásticos para desbravar territórios desconhecidos, para trazer material muito rico de pesquisa, de observação, que confrontado com nossa capacidade de análise pode produzir resultados surpreendentes.
É importante ir até onde eles estão, conhecer o que lhes é importante, entender como navegam. Se conseguimos acompanhá-los nas formas de pesquisar, comunicar-se e divulgar-ser, poderemos partir de onde eles estão e ajudá-los a evoluir, a degustar outros sabores e ritmos, a descobrir outros mundos diferentes dos que eles valorizam. O acolhimento afetivo é o caminho para encontrar os melhores percursos para chegar às suas mentes e corações. A aproximação ao mundo deles nos ajudará a encontrar atividades, recursos e desafios que façam sentido para nossos alunos e também para nós.
Nós tentamos mudar a escola, mas eles a redesenharão, quando forem adultos, a partir da riqueza de experiências de aprender juntos conectados.  Somos uma geração ponte entre modelos industriais consolidados no passado e outros mais flexíveis que estamos construindo penosamente aos poucos até que eles, já nascidos neste novo mundo, concretizem suas experiências acumuladas de aprendizagem digital em processos organizacionais muito mais próximos da sua sensibilidade, com práticas mais  coerentes e significativas, que façam sentido no mundo em que eles sempre viveram, tão diferente de como nós aprendemos.

Comentários

Marli Fiorentin disse…
Professor, eu tenho observado bem de perto essa questão. Trabalho no momento com crianças de 5 anos,uso a tecnologia e elas supreendem mesmo . A turma do ano passado, com a qual eu mantinha o blog Pintando o Sete, me encntra pelos corredores da escola e seus olhinhos brilham ao perguntar: "E o nosso blog"? Eles fazem descobertas incríveis. Mesmo ainda sem saber ler, conseguem ter autonomia diante da tela. Muito bom o seu texto . Vou fazer uma postagem no novo blog e indicar aos pais. Abraço!
Marli Fiorentin disse…
Esse é o link do blog. http://diariogalerinha.blogspot.com.br/2012/05/adultos-criancas-e-tecnologia.html
Muito interessante professor! Obrigada por compartilhar esse texto.
A única coisa certa e do que não me envergonho é que não tenho medo de dizer que “não sei e quero aprender”. De outra forma acho que seria difícil acompanhar essa turminha.
José Moran disse…
Caras Marli e Josete: Esse texto reflete mais a minha vivência do que a de vocês que são muito mais novas do que eu e que estão mais próximas das crianças (eu convivo mais com jovens e adultos). Mas creio que é útil discutir mais como conviver melhor e ensinar uma geração que está muito mais conectada do que nós quando éramos pequenos. Obrigado pelas contribuições. Grande abraço. Moran
Unknown disse…
È uma realidade a geração de crianças da era da informática, elas estão a frente do tempo, tudo é para ontem, as explanações baseadas nos livros ficam entediadas, eles querem é acessar a internet e saber das novidades que surgem a cada segundos, daí a importância de dialogar para chegar em um consenso, o professor hoje deve conhecer e saber trabalhar com as informações para não ficar fora do contexto da geração Y e outras que virão.
Mortalot Sv2 disse…
Este comentário foi removido pelo autor.
Eepam disse…
Nós, alunos da rede estadual do estado de Minas Gerais, acabamos de ler o seu texto, o qual concordamos pois realmente, fazemos parte desta "geração tecnológica".
Por outro lado, sabemos também que só a maquina não nos oferece os conhecimentos suficiente. É necessário a presença de um orientador, para o auxilio de tentos recursos.
Alunos: Diógenes Faleiros, Vitor Miranda e Isaac Ezequiel.
E.E. Professor Antônio Marques. Araguari - MG.
Unknown disse…
.bom Tarde!Meu nome é Silvia (silvialoverga@uninove.edu.br) Faço Pedagogia em EAD na UNINOVE.Durante um trabalho de Tecnologia Aplicada à Educação da ProfªAndreza Gessi Trova,acessei este blog e fiquei admirada com o que li e me identifiquei com ele.Pretendo tornar habitual esse meu ir e vir!...
Fantástico não eu da era analógica dentro deste espaço virtual tão acolhedor e até pareceu-me familiar!?
Agradeço esta oportunidade de participar desse blog,como posso dizer?estou super animada pois é o meu primeiro oi!Não sei que imagem sairá em meu perfil!
Unknown disse…
Olha Professor! Eu concordo com a Josete Zimmer eu não me envergonho em dizer que "eu não sei e quero aprender". porque esta muito além do imaginamos eu como professora tenho muito que aprender foi muito bom ler este texto ele reflete muito nossa vivência nos dias de hoje e amanhã.

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